domingo, 26 de agosto de 2018

Andar com minha fé eu vou



Quando eu era criança, não usava sapatos. Sentir a areia, a terra, as pedras e até mesmo os cacos de vidro não me incomodava. Era normal sentir a natureza, já que eu também fazia parte dela. O gelado das águas me encantava como se eu voltasse á minha própria origem.

Passei a calçar sapatos quando percebi que estar descalça era mal visto, que minha imagem despertava liberdade e selvageria, tudo o que uma mulher não pode ter. E  logo apareceu um par que apesar de muito desconfortável, tinham uma boa aparência e me dava um status respeitável. O calcei durante longos anos e a medida que fui crescendo, ele apertava, dava calos, prendia meus passos, torturava meus pés e eu não conseguia  mais sentir a natureza da qual faço parte. Como na história original de Cinderela, chegaria um momento em que seria necessário decepar meu dedo ou calcanhar para continuar cabendo no sapatinho de cristal.  Doeu me desprender de algo que me serviu por tanto tempo, mas antes que eu me livrasse de pedaços meus, joguei meus sapatos fora!
Foi estranho sentir novamente os quatro elementos roçando e machucando novamente meus pés, mas percebi que apesar de sensíveis pela época em que passaram abafados, continuavam fortes, ágeis  e desejosos de sentir na pele o mundo.
Muitos dos que ainda usam os sapatos que me apertavam preferiram decepar a si mesmos para continuar os calçando e sendo bem aceitos pelos que tem medo de andar com os pés no chão. A grande maioria deles não caminha mais ao meu lado. Permiti-me até mesmo  calçar sapatos novos, muito mais confortáveis!, aos quais recorro  sempre que meus pés precisam de um alívio pela brutalidade do asfalto , mas não tenho mais a necessidade de proteger-me de todas as experiências que a jornada me proporciona. Decidi voltar á minha natureza ,olhando para trás e tendo o prazer de ver  a marca de minhas próprias pegadas

5 comentários:

Sinta-se á vontade